Quem não se inventa não existe.

POEMA RIDÍCULO (AI CIDADE)

Carros vespas,

ratos moscas, luzes névoas,

estrada parada, cuecas molhadas,

cimento pó, bocas descalças, nozes faróis

e vozes em nó.

 

Tempo litro,

pressa morta, árvores tombadas,

varandas vis, bigodes gay, rampas de aranha,

rio de livros e pessoas sós.

 

Cães uvas,

cartazes secos, sapatos de álcool,

cigarros de mentira, saliva legendada,

esplanada de bonecas, bilhar descaído,

alturas rasas e noite acordada.

 

Rodas ocas,

chuva de óculos,

candeeiros perfumados,

sirenes idóneas, dinheiro sujo,

vasos mil, pisca-piscas murmurados,

múmias campainha e montras gordas.

 

Casas pintadas,

fios emaranhados, corrupios letrados,

janelas vazias, água benta, azeite depilado,

escovas de aço, vinho do porto e olhos fechados.

 

Sinais falsos,

amor socalco, nuvens nervosas,

pedras atiradas, matrículas vampíricas,

cabelos ventríloquos, vassouras rotas, ruído usado

e silêncio de quando.

 

Mendigos ricos,

lixo maltratado, escadas rolantes,

gaiolas afogadas, prisões de ventre,

castelos de beijos, luxo pecado, espelhos de lama

e joelhos calejados.

 

Cadeiras frias,

correio parido, portas enferrujadas,

lentidão óleo, guardanapos fungados,

lábios rachados, poesia nua, batom de cerveja

e grito despenteado.

 

Carris desalinhados,

passadeiras castradas,

brinquedos salpicados, jardins de papel,

anéis sem dedos, relógios atrasados,

narizes constipados, música pálida

e orelhas roucas.

 

Sacos sem fundo,

caixotes sem tampa,

vidro quebrado, saias curtas,

volantes empenados, paixão doente,

cores sem temperatura, limões espremidos

e fogo imaginário.

 

Filas enforcadas,

pontes desmaiadas, chão de gelo,

bebés adultos, mães viúvas, gatos ciosos,

botões sem nexo, choros importados

e muletas de esperança.

 

Merda à vista,

garrafas sem rolha,

energia desperdiçada,

quiosques viciados, nomes escondidos,

alguidares de agulhas, sutiãs desempregados

e chocolate quente.

 

Ai cidade que és um poema ridículo.

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